De ontem para hoje, o que mudou nos profissionais da Computação?
Steve Wozniak, Sabeer Bhatia, Blake Ross, Steve Perlman. São nomes que, a primeira vista e para quem não é da área, talvez não digam nada. Mas, se os relacionarmos à Apple Computer, Hotmail, Firefox e WebTV, respectivamente, teremos em mãos alguns dos principais nomes da computação moderna. E ainda, se juntarmos a outros nomes como Bob Davis (Lycos), Max Levchin (PayPal), Jerry Yang e David Filo (Yahoo!), Bill Gates (Microsoft) e Tim Berners-Lee (pai da internet) entre outros, teremos grande parte da história, não só da computação, mas de toda a web.
A grande maioria dessas pessoas veio do nada, apenas com uma idéia na cabeça e muita determinação. Iniciaram algo que, na época, era tratada apenas como uma ilusão ou algo que “não levaria a nada”. Alguns deles, como Jerry Yang e David Filo, do Yahoo!, somente foram adiante depois de penar, e muito, tendo de enfrentar situações como falta de energia elétrica e pane constante nas máquinas. Para quem pensa, hoje, na marca Yahoo!, automaticamente a relaciona aos grandes portais ou a uma empresa com sua sede num enorme prédio comercial cheio de funcionários e com todo o luxo das grandes corporações. Porém esquecem que o Yahoo! nasceu e permaneceu instalado num trailer, que ficava estacionado num pátio de universidade, durante muito tempo.
Problemas com servidores, espaço físico das instalações, funcionários sem a capacitação necessária ou falta de dinheiro eram comuns, mas havia algo ainda pior: a falta de interesse dos meios profissionais e acadêmicos. Todo começo é complicado, mas é ainda pior quando não se tem a tecnologia necessária, sendo preciso desenvolve-la, cria-la e, ainda, provar que vai ser útil (em alguns casos, imaginar uma aplicação), para pessoas céticas, que só enxergam o presente. Esse talvez tenha sido o grande diferencial que transformou idéias “românticas” em corporações gigantescas, como a Microsoft, a Adobe, o PayPal ou, mais recentemente, o Twitter. Empresas essas que hoje valem centenas de milhões de dólares (ou bilhões, dependendo da empresa), mas que nasceram da simples idéia de alguém num curso de faculdade ou de qualquer outra pessoa com determinação suficiente para acreditar em si próprio e levar aquela idéia adiante.
O mundo da computação, e mais especificamente a web, proporcionam isso, a chance de ter idéias e transformá-las em realidade lucrativa. Hoje, logicamente, com menos dificuldades quanto à tecnologia e disponibilidade de recursos, sejam profissionais ou capitais, mas, como tudo acaba saturando, com uma redução drástica de oportunidades de criação ou coisas novas a serem inventadas. Novos profissionais ainda prosperam, porém motivados por modismos ou pela ilusão de que basta sentar num banco de faculdade, ler um monte de livros e sair por ai ganhando milhões. De milhares desses profissionais que aparecem ano a ano, dois ou três realmente se realizarão ou realizarão algo pela computação e pela web.
É bom ver que ainda existem mentes capazes, audaciosas, ávidas não apenas por ganhar dinheiro, mas por construir algo. Steve Wozniak provavelmente tenha sido o último grande romântico da computação, pensando e edificando equipamentos não apenas para satisfação financeira, mas para completar uma ânsia premente que o movia, a de provar que era capaz de construir um computador, ou de melhorar o que já existia, partindo do zero ou de algumas peças adquiridas aqui ou ali. Investiu tudo o que tinha, ou mais, investiu ele próprio. E fez, venceu. Obviamente a época era outra, existindo muito para ser pensado ou criado. Mas a grande diferença de Wozniak e alguém que se comprometa a ser um desenvolvedor ou criador nos dias de hoje é uma coisa chamada obstinação. Steve Jobs dificilmente teria construído a Apple, ou feito dela o que é hoje, sem ter ao lado um obstinado como Steve Wozniak. Agora, a pergunta: e Steve Wozniak teria feito algo sem Steve Jobs como sócio?
A história mostra que os grandes gênios são sempre sentimentais, temperamentais ou românticos amalucados, quando não tudo de uma só vez. E somente sobreviveram de forma satisfatória quando algo ou alguém contrabalançou essas tendências. Obviamente, Wozniak não teria sido ninguém sem Jobs, ou Jobs não teria feito nada sem Wozniak. O romantismo científico de um, aliado a audácia administrativa de outro fez da Apple uma gigante. Outras gigantes apareceram, como IBM, Xérox, HP e outras, mas a Apple sempre terá a marca da ousadia de Jobs e da obstinação de Wozniak. Duas pessoas com uma idéia na cabeça, pouco dinheiro e muita força de vontade.
Um fator determinante ao sucesso profissional de talentos emergentes é, infelizmente, o comportamento do mercado mundial. Ele, o mercado, tange os rumos da computação e da web de uma forma que, se alguém tiver qualquer boa idéia e não a colocar em prática na hora certa, fatalmente naufragará. É um mercado cruelmente dinâmico, lançando tecnologias e tendências de uma forma impossível de se acompanhar. O que hoje vale ouro, amanhã é descartável, inútil, assim como o profissional que deixa de se atualizar. Não se pode mais viver de uma única idéia. Tudo passou a ser corporativo. Então, ou esse profissional se prende nas linhas de produção, as quais são incapazes de inovar com ousadia por terem muito a perder, ou tenta a sorte por conta própria, jogando com o risco de uma excelente idéia não encontrar aporte suficiente para ser levada adiante.
Nunca esteve tão em voga a frase “nada se cria, tudo se copia”. Com a popularização em massa e avanço tecnológico tanto de equipamentos quanto da web como ferramenta de comunicação e trabalho, muitas coisas foram criadas nos últimos 20 anos. Algumas deram certo, se tornando indispensáveis, outras nem tanto. Muito do que se fez nesses anos, se perdeu no tempo, sem sequer saber quem desenvolveu. Ultimamente, vem se adotando algo como um “remake”, porém não de coisas já ultrapassadas e numa tentativa de serem avivadas, mas de algo que está ativo, moderno. Em outras palavras, pega-se algo, modifica-se aqui e ali e se lança com outro nome. Cópia. Basta ser lançado algo que chame a atenção que imediatamente surgirão inúmeras versões daquele produto ou serviço, todos melhorados mas vindos de uma mesma base. E não se pode culpar profissionais ou corporações. O mundo moderno obriga a isso. Existe uma carência muito grande de originalidade ou, até mesmo, de ousadia, coisa que outrora transformou simples idéias estapafúrdias em grandes sucessos comerciais.
Os produtos, mesmo com a popularização e aperfeiçoamento das tecnologias, continuam caros. E parte deste “preço” provém justamente do grande número de profissionais que surgem todos os dias. À primeira vista, pode parecer algo contraditório, mas, se levado em conta que bons profissionais não aparecem todos os dias, todo e qualquer aluno de universidade que demonstre razoável talento, é imensamente disputado pelas corporações, elevando assim seus salários. Ao demonstrarem real talento, passam a ser disputados ainda mais, fazendo seus altos salários subirem novamente. Essa mecânica acaba influenciando todo o mercado, que por si só já é especulativo, e gerando um eterno viés de alta nos salários das categorias que estão abaixo desses ótimos profissionais. Portanto, enquanto a modernidade barateia a produção, os profissionais a encarecem com seus ganhos. E a troca de altos executivos se tornou constante, o que deixa de ser benéfico para a empresa que investiu, e muito, na formação desse profissional. Ela, a empresa, acaba tendo que formar outro para o lugar daquele que saiu, investindo tudo novamente, mas, como a substituição tem que ser imediata, é obrigada a trazer outro de fora, gastando ainda mais com altos salários.
É difícil, hoje, encontrar algum produto com assinatura. Muito recentemente, a Microsoft lançou o Bing, um sistema de buscas para a web e feito para substituir o Live Search, tentando, assim, aumentar sua participação nesse mercado. O Bing teve inúmeras modificações, estruturais ou de layout, em relação ao sistema antigo e contou com o gerenciamento de desenvolvimento de Brain MacDonald, que já havia desenvolvido outros projetos de sucesso para a própria Microsoft. Leve-se em consideração que a Microsoft é uma das maiores consumidoras de novos talentos do mercado, mas, mesmo assim, optou por entregar seu novo projeto para alguém da velha guarda. Questão de eficiência e formação ou romantismo profissional?
Novos talentos existem sim, mas educados de forma diferente. A própria formação acadêmica se dá de forma diferenciada, se comparada com 20 anos passados. Hoje, tudo é simplificado, com um número muito grande de cursos e instituições para formar especialistas, diferente de quando alguém fazia um curso da área por realmente gostar e ter interesse profundo sobre aquilo. Qual programador, hoje, saberia montar a própria máquina de trabalho, circuito por circuito? Soldar cada peça? A dificuldade que existia antigamente em se levar um projeto adiante, fazia daqueles profissionais verdadeiros obcecados em vencer, e, com isso, pessoas com uma visão de mercado muito maior. Isso, por sorte, deixou de ser necessário. Mas, em contrapartida, acomodou um pouco os novos profissionais, tirando deles essa visão ampla que se fazia naturalmente em tempos passados. Então, provavelmente, a Microsoft resolveu entregar seu projeto de um novo sistema de buscas nas mãos de alguém já “mais antigo” na área não pela formação ou capacidade técnica, mas por ser alguém que vivenciou um pouco desse universo escasso, e que, principalmente, tem a visão mais aguçada em relação aos que vêm chegando agora no mercado.
MarcioJR.